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Textos

O Padre.

                         Nos tempos da inquisição da idade média, muitas foram as pessoas que entraram nesta árdua e nobre missão. Historicamente nem todas foram nobres, pois alguns padres se aproveitaram da situação para obrigar as pessoas a se subjugarem. Mas assim como as pessoas são diferentes entre si, os padres também são. E, naquela época, surgiram padres guerreiros na Itália, alguns sob a efígie da Cruz de Cristo numa roupa que lembraria um manto e não uma batina e batizados de Combattenti, que significa Combatentes em italiano, e devidamente autorizados por sua santidade o Papa a usar de todos os meios para caçar. Vampiros, lobisomens, bruxas e até alguns magos negros que ainda perambulavam pela Europa eram os alvos.
               No meio destes padres existiram alguns que se tornaram verdadeiras lendas. Um deles, o padre Furio “Braccio di ferro” Archetti, era o mais mortal de todos. Diziam as pessoas na época que Archetti possuía a alcunha de Braço de Ferro por bater sem dó nas criaturas malignas, outros diziam que ele possuía realmente um braço feito de ferro encantado pela magia negra de uma bruxa e que o Santo Papa na época não o considerou um herege, mas sim que se ele tinha realmente uma peça em seu corpo, provida de magia negra, mas que era usada pelos ideiais da igreja, ele não se importava. A peça seria o “Braço negro da igreja na luta contra a heresia”. Se o braço era realmente de ferro ou não somente os seres das trevas descobriram e não viveram para contar, pois Braccio de ferro não possuía amigos. Mas toda lenda recontada pode ter sido alterada...

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                         Seguindo a pista de um vampiro ancião, Furio Archetti atravessa as terras da Itália em sua caçada. Passando pelo entorno da cidade de Florença, ele se depara com a cena de uma batalha sangrenta. Um homem e um vampiro num embate em que aparentemente o caçador humano está levando a pior. Ele não consegue reconhecer o homem, mas o vampiro ele reconhece, Mirko Aleanos, um dos três anciões da Europa e seu alvo atual. Sem parar para pensar e disposto a impedir que o vampiro possa fugir ele solta sua bolsa no chão ao mesmo tempo em que saca sua espada consagrada e parte para o embate.
                         Para o caçador humano a ajuda veio na hora certa. O vampiro Aleanos em vantagem sobre ele já está a subjuga-lo no chão apertando seu pescoço e preparando a mordida maldita. Graças a seus sentidos apurados o golpe desferido por Furio não foi fatal, mas o rasgo sofrido em seu flanco foi suficiente para retirá-lo de cima do caçador e fazê-lo urrar de dor, quando a lâmina, benta, lhe queimou a carne.
                         - Maldito, vou destroçar você e ele quando eu acabar.
                         Por ser um vampiro ancião, o poder de Aleanos é realmente grande, mas Furio não se tornou uma lenda dos Combattenti à toa também. Aleanos praticamente voa na direção de Furio aos olhos espantados de Andreas Richter e, por subestimar o oponente, é recebido por mais um golpe certeiro da espada consagrada. O cheiro de carne queimada toma conta do ambiente.
                         - Maldição, como pode isso? Você é um Combattenti?
                         - Demorou a pensar nisso, besta fera. Eu sou Furio Archetti.
                         - O Braccio de Ferro. Já ouvi falar. Você deve saber então que sou Mirko Aleanos e que hoje é a noite de sua morte.
                         - Vamos ver.
                         Furio se coloca em posição e Aleanos ataca novamente. Desta vez sua velocidade é grande o suficiente para confundir as ações de qualquer um, menos de alguém como Furio. Ele espera o momento certo de atacar o vampiro. Em sua trajetória, Aleanos o atinge duas vezes, uma no peito e outra no rosto, ataques calculados, e o terceiro vem na mão da espada para arrancar-lhe a peça mortal. A peça voa da mão de Furio, mas antes que Aleanos possa pensar na próxima ação a mão de ferro de Furio agarra seu pescoço. É isso mesmo, Furio “Braccio de ferro” Archetti tem realmente um braço de ferro. E para piorar a situação do vampiro, o braço é bento.
                         - Nem com toda sua força e fúria você sairá deste aperto, vampiro.
                         - O braço é de ferro mesmo.
                         - Sim, e é bento, já que sou um padre.
                         Sob a força do braço de ferro de Furio, Aleanos vai sentindo suas forças se esvaírem. Ele ainda tenta algo, mas só o que consegue é rasgar o pano que envolve o braço e deixa-lo à mostra para o incrédulo Richter. Aleanos já tinha ouvido falar das histórias sobre o braço de ferro, mas nunca tinha acreditado e agora ele o sente na pele. Aos poucos ele vai percebendo o quão amargo será o abraço da morte. Já nos estertores da vida do vampiro, Archetti o solta, busca sua espada e sob o olhar mortiço, mas aterrorizado da besta, decepa sua cabeça.
                         Calmamente Furio vai até sua bolsa, retira uma espécie de cantil de pano e segue na direção de Richter. Ante a aproximação do padre Combattenti o rapaz se encolhe no chão.
                         - Cheio de coragem enfrentando Aleanos e com medo de mim?
                         - Você tem um braço de ferro. És um demônio.
                         - Não diga besteira jovem. Eu sou um padre com um braço de ferro. Anda, fica quieto e bebe este líquido. Vai melhorar-te.
                         Sem forças para recusar, Richter sorve todo o líquido de uma vez e se espanta não apenas com o sabor, mas também com o efeito revigorante da bebida.
                         - É vinho.
                         - Sim, é vinho rapaz. Achou que fosse sangue do demônio?
                         - Diante da visão de um braço como este...
                         - É, realmente é uma visão bizarra, meu rapaz. São ossos do ofício. Você já consegue se levantar?
                         - Acho que sim.
                         - Então ande, pois para cuidar do restante de seus ferimentos temos que andar um bom pedaço ainda até uma igreja em Florença e eu não vou te carregar.
                         - Não precisa me levar. Eu não preciso de ajuda. Vou continuar caçando.
                         - Rapaz, você enfrentou Mirko Aleanos, um dos três vampiros anciões. Acha que os ferimentos que ele te causou vão sarar facilmente? Eu vou ajuda-lo.
                         - E porque um homem que tem um braço de ferro que certamente é coisa do capeta me ajudaria?
                         - Primeiro porque meu braço não é coisa do capeta e segundo porque sou um padre. Isso basta?
                         - Não.
                         Furio coloca a ponta de sua espada na garganta de Richter.
                         - Tem medo de morrer?
                         - Não.
                         - Ótimo. – ele abaixa a espada. Você é o homem certo. Vamos.
                         Incrédulo, Andreas Richter acompanha o padre Furio. No fundo ele confia no padre, apesar dele se parecer com uma aberração. Ao longo dos dias que passa na igreja curando os ferimentos causados pelo vampiro ancião, Furio lhe mostra técnicas de combate que ele nunca imaginaria usar contras os seres das trevas. Armas consagradas ele já havia usado, mas estacas de madeira oca cheia de água benta e facas de arremesso com cruzes em relevo da ponta ao cabo são algumas das novidades que ele observa na igreja.
                         Também neste período, Richter conheceu um pouco do padre Furio Archetti. O padre conhecido como Braço de ferro descobriu sua vocação na vida aos dez anos de idade ao ver sua mãe e seu pai serem mortos por um lobisomem. Quando o animal estava prestes a acabar com sua vida um padre Combattenti, Ferrino Alboreto, surgiu como um jaguar do meio do nada e literalmente se atracou com a besta fera. Alboreto era conhecido como Garra de Tigre, pois desenvolvera, com a ajuda de um ferreiro, ponteiras de ferro para seus dedos que aliou a sua técnica de combate corpo a corpo. O homem era uma verdadeira máquina de matar. O lobisomem pereceu em segundos. Ao término do confronto ele se deparou com o olhar triste, porém determinado, do garoto Furio Archetti e percebeu que ali estava mais um caçador, mais um padre Combattenti da Santa Madre Igreja.
                         Treinado por Alboreto a partir de seu encontro, ordenado padre aos dezoito e declarado Combattenti por sua Santidade, o Papa, aos vinte e um anos de idade, Furio iniciou sua vida, não como pastor das ovelhas do rebanho de Deus, mas como o guerreiro caçador de seres das trevas a serviço da igreja.

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                         Ao cabo de duas semanas, Andreas Richter já sentindo que seu corpo se curara totalmente resolveu se despedir do padre Furio.
                         - Creio que nosso tempo juntos acabou, padre.
                         - Creio que não rapaz. Você me deve sua vida e eu preciso de sua ajuda.
                         - Um padre me cobrando uma dívida de vida?
                         - Não. O padre pede sua ajuda, o Combattenti lhe cobra a dívida, mas não se preocupe, você irá gostar da minha proposta.
                         - Você é estranho padre. Eu não quero negócios com você. Agradeço a ajuda, mas vou seguir meu caminho.
                         - Porque você foi atrás de Aleanos?
                         - Porque eu sou um caçador.
                         - Nada disso. Você queria morrer. Nenhum caçador enfrentaria um dos três vampiros anciões sozinho.
                         - Você pretendia fazê-lo, padre.
                         Pela primeira vez no tempo em que estão juntos Furio retira o pano que cobre seu braço deixando a mostra a peça bizarra. Richter percebe que o braço de Furio parece ter sido decepado pouco abaixo da axila e ali foi encaixado o braço de ferro.
                         - Eu possuo isto aqui rapaz, que me dá uma grande vantagem sobre estes seres malditos.
                         - Um braço tão maldito quanto eles.
                         - Pare um pouco com isso. Meu braço não é maldito. Aprenda uma coisa, a igreja iniciou a Santa Inquisição há um certo tempo para extirpar tudo aquilo que é diferente de seus padrões. Porque eu não seria extirpado?
                         - Porque é padre?
                         - Porque sou um homem que luta por uma causa e embora seja diferente minhas ações falam por mim. Eu já permiti que alguns vampiros, lobisomens, bruxas e até magos vivessem porque me mostraram que não eram seres malignos, eram apenas diferentes. Alguns não tinham culpa do que se tornaram nem usavam sua arte para o mal. A Santa Inquisição pode ser deturpada por alguns, mas por mim não. Eu faço uso de seus preceitos para extirpar da terra os malignos. Quer saber como um braço de ferro pode se mexer?
                         - Se você quiser contar.
                         - Um mago é responsável por isso. Quando perdi meu braço eu fiquei louco, pois não poderia mais caçar, meu propósito de vida tinha sido destruído. Mais uma vez Ferrino Alboreto me salvou. Ele me levou ao ferreiro que fez suas ponteiras e ele me fez este braço. O braço não tinha muito movimento, só me servia para bater com movimentos verticais e a mão não se abria. Uns três meses depois eu encontrei um mago. Ele estava usando sua arte contra um homem sufocando-o. Sem saber o que o homem tinha feito eu parti diretamente para cima do mago. Para minha sorte e dele eu fiz barulho e ele pode se defender. O mago não era um homem ruim e me mostrou a marca do assassínio no pescoço do homem. Aquele imundo havia maculado uma criança de oito anos. Nem preciso dizer que ele encontrou o caminho dele através das ações nada convencionais do mago e de minhas, como dizer, “orações”.
                         - E daí?
                         - Daí que o mago percebeu meu braço de ferro e se interessou. Ele já conhecia meu nome e sabia de minha fama e me ofereceu a oportunidade de melhorar-me.
                         - Encantando seu braço de ferro.
                         - Exatamente.
                         - Um mago poderoso como este seria capaz de tornar alguém imortal?
                         - Para quem queria morrer você muda de ideia rápido.
                         - Você me mostrou que não podemos fugir de nosso destino Furio. Eu estava fugindo do meu procurando a morte, mas agora a ideia da imortalidade para encontrar meu destino novamente me é bem mais interessante.
                         - E qual seria seu destino sendo imortal?
                         - Encontrar uma bruxa.
                         - Para mata-la?
                         - Não, para poder amá-la novamente.
                         - O amor nos leva a fazer coisas insanas, mas querer morrer também é insano. Ajude-me em minha próxima caçada e eu te levo a Sarator.
                         - O que você irá caçar?
                         - Lilith.
                         - A mulher de Lúcifer? Como você pode ter certeza que ela está na Terra?
                         - Quem você acha que arrancou meu braço?




Lilith!!!
 
Léo Rodrigues
Enviado por Léo Rodrigues em 10/07/2011
Alterado em 07/05/2020
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