O resgate.

“Pronto para a caçada?”
“Sim.”
“É bom que esteja mesmo, pois não vai ser fácil.”
“Eu sei. Mas sei também que a rainha feiticeira Samara precisa ser resgatada a qualquer custo.”
“O que quer dizer?”
“Eu convoquei Alaran para nos ajudar.”
“Alaran? O vampiro renegado? Você está louco, Jayn?”
“Não, Pyrax. Um lobisomem e um Akarys não serão suficientes para entrar e sair de Kálera.”
“Alaran não vai conosco, Jayn.”
“Droga, Pyrax, ele é o único que conhece o labirinto. Ele renegou os dele e agora é um aliado, aceite isto.”
“Não!”

O vampiro renegado Alaran entra na sala.

“Eu sabia que isto ia acontecer, Jayn. É melhor que eu não vá.”
“Você não tinha nem que estar aqui, seu vampiro maldito.”
“Pyrax, lembre-se: nossas raças são inimigas desde os primórdios em Azíria, mas todos sabemos que nosso futuro depende de Samara. Isto é fato. Amato está no paralelo Terra, confinado pela traição de um dos seus, lembra? Não foi um vampiro que prendeu Amato lá, foi um lobisomem, um maldito lobisomem que se uniu a Balar, o grão-mestre dos Antirus.”
“Ele está certo, Pyrax. Se um lobisomem passou para o outro lado, um vampiro pode passar para o lado de cá e nos ajudar.”
“O que o faz confiar tanto em Alaran, Jayn?”
“Os Akarys renegam sua raça para aprenderem a magia de Azíria. Eu nasci vampiro, Pyrax, e Alaran é meu irmão.”


Labirinto Hodess, a entrada para a terra obscura de Grainol, o reino dos vampiros de Azíria.

“Você vai na frente, Alaran.”
“Ele vai, Pyrax, pois é o único que conhece a saída para Kálera.”
“Um conselho para você, líder dos Ravens: não se transmute. A saída para Kálera é próxima à entrada de Grainol. Os caçadores sentem o cheiro de um lupino de longe, principalmente de um Raven.”
“Assim fica mais fácil para você nos trair.”
“Pense o que quiser, Pyrax. O problema é que, se os caçadores sentirem teu fedor, eles virão atrás de nós.”

Pyrax deixa suas garras aflorarem enquanto o ódio toma conta de seu interior. Jayn tenta contê-lo.

“Eu sou um Akarys jovem ainda, meu amigo lupino, mas já sei reverter sua mutação. Façamos como Alaran orientou. Será melhor para todos.”

Diante da súbita atitude de Jayn, Pyrax se retrai.

“Assim será então, mas aviso, Akarys Jayn: a responsabilidade passa a ser toda sua.”

Jayn assente com a cabeça e, agora liderados pelo vampiro renegado Alaran, os três guerreiros adentram o Labirinto de Hodess.

Alaran conhece bem o labirinto, pois desde sua infância foi criado ali dentro, sendo preparado para assumir seu posto na casta como um caçador. Um predador dos incautos que se aventuram por ali e o pior pesadelo dos Ravens. Sua convicção de que Samara uniria os povos em Azíria o fez renegar o destino que lhe fora traçado. Agora ele é um expurgado, um pária, mas um ser cuja consciência está tranquila. Ele luta pelo que acha certo. Lutar por Samara. Lutar por Azíria.

Sem Alaran, a travessia do labirinto poderia ser bem mais penosa, pois além dos caçadores, Hodess guarda algumas surpresas desagradáveis aos seus visitantes.

Em dado momento, Alaran para.

“O que foi?”
“Silêncio.” – Alaran ouve por um instante.

“Jayn, hora de agir. Você consegue nos esconder?”
“Consigo.”
“Então faça, e rápido.”

O Akarys começa a entoar um cântico rápido de um feitiço que irá mimetizá-los ao ambiente.

“Não falem e não se mexam.”

Dois minutos são suficientes para que passem pelos três uma patrulha de caçadores montados em Áuspios, as bestas-feras metade lobo, metade lagarto. Os quatro integrantes passam conversando em sua língua. Somente Pyrax não os entende.

Após um tempo seguro de espera, Alaran quebra o silêncio.

“Temos que correr.”
“Sim. Pelo que disseram, teremos uma chance única se chegarmos a tempo.”
“O que eles disseram?” pergunta Pyrax.
“Que Samara será levada de Kálera para Grainol. Aviran a quer.”
“Ele vai matá-la?”
“Não. Vai torná-la vampira.”


Entrada para Kálera. Vinte caçadores montados em Áuspios fazem a guarda do caminho pelo qual Samara passará.

“Desvantagem numérica. Alguma ideia, Alaran?”
“O líder dos Ravens pedindo minha opinião? Que mudança rápida.”
“Não abuse da sorte. Você os conhece melhor que eu.”
“Jayn, você é capaz de conjurar o fogo?”
“O fogo de Hamas? Não tenho poder para afetar os vinte totalmente. E você também poderá ser afetado.”
“Eu corro o risco. Os que forem parcialmente afetados serão presas fáceis para Pyrax. E Samara, uma vez solta, terá uma chance de fuga.”
“É suicídio.”
“E alguém disse que seria diferente, Pyrax?”

Neste instante, Samara ultrapassa o umbral da passagem escoltada por dois Ashays caçadores. Alaran olha para Jayn. O Akarys hesita.

“Faça.”

Jayn invoca o Fogo de Hamas. A magia do Elemental do fogo se manifesta internamente aos seres da escuridão. O Akarys não imaginava que seu poder estivesse tão intenso.

Dos vinte e dois vampiros e vinte Áuspios, todos os Áuspios e dezesseis vampiros não esboçam reação ao terem seus corpos consumidos pelas chamas mágicas. Alaran contrai o corpo, mas não se inflama.

“Pyrax, não perca tempo. Mostre o ódio que você nutre pelos Ashays. Dê cabo dos que sobraram.”
“Será um prazer.” responde Pyrax, já em sua forma Raven.

Pyrax galopa rapidamente na direção dos dois Ashays que fazem a guarda de Samara e não foram afetados pelo fogo elemental. Jayn utiliza bolas de fogo para abrir o caminho para o lupino.

Os dois caçadores veem o fogo explodir à sua frente e, para sua surpresa e terror, são surpreendidos por um Raven em fúria saindo pelo meio das chamas. As garras de Pyrax passam em tamanha velocidade que os vampiros demoram a perceber que estão perecendo.

Ato contínuo, o lupino arrebenta os grilhões mágicos que prendem Samara com a adaga encantada por Ghan, o mestre de Jayn.

“Pyrax.”
“Samara. Não temos tempo a perder.”
“Vocês caíram na armadilha de Aviran.”
“Como é?”

De fato, saindo da passagem para Kálera, o Mestre Vampiro Aviran vem caminhando calmamente, enquanto Jayn e Alaran se juntam ao guerreiro Raven e à Rainha Feiticeira.

“Agora eu poderei matar todos os meus desafetos de uma só vez. Pena que Ghan não tenha vindo.”
“Você é muito previsível, Aviran. Ghan sabia o que você tramava. Por isso eu vim com eles.”
“O que quer dizer, Alaran?”
“Samara, use sua magia associada a isto.”

Ele joga um anel para a Rainha Feiticeira.

“É o Anel de Farah Azíria. Saiam daqui. Aviran é meu.”
“Prepotência. Um adversário prepotente é um adversário morto, Alaran. Você não é nem nunca será páreo para mim. Os três idiotas podem fugir desta vez, mas você vai pagar caro.”
“Veremos.”

Enquanto Alaran se prepara para o confronto, Samara conjura um portal de teletransporte com a ajuda do anel mágico. Eles ainda hesitam diante da batalha que irá se iniciar.

“O que o faz achar que pode me vencer, Alaran?”
“A magia de Azíria.”
“Não seja tolo. Só quem detém a magia de Azíria são os Akarys.”
“Tem certeza? Há uma exceção.”
“Não é possível.” – surpreende-se Jayn.
“O que foi, Akarys?”
“Alaran tornou-se…”
“Não faça essa cara de espanto, Aviran. Eu sou a personificação da lenda. Eu sou um Seyan.”
“Seyan ou não, você não viverá para contar história.”

Aviran parte em direção a Alaran, iniciando a luta que o Mestre Vampiro mais ansiara em toda a sua vida: enfrentar um Seyan, o único ser em toda Azíria que nunca precisaria renegar sua raça para deter o poder da magia.

“Mesmo sendo um Seyan, Alaran não conseguirá vencer Aviran. Ele é o vampiro mais antigo que existe e nunca foi derrotado.”
“Jayn, eu sei que ele é seu irmão, mas temos que sair daqui. Samara ainda corre perigo. Faça valer a pena o sacrifício de seu irmão. Ande.”

Arrastado para dentro do portal por Pyrax, Jayn se deixa levar, impotente, por saber que seu irmão é a personificação de um Seyan. A felicidade se faria presente, não fosse ele estar enfrentando o pior de todos os vampiros da terra de Azíria. Ninguém nunca venceu Aviran.

Após atravessar o portal, Samara rapidamente o fecha para evitar qualquer surpresa desagradável. Quem os aguarda do outro lado é Ghan, o mestre Akarys de Jayn.

“Bom vê-la, Samara.”
“Mestre.”
“Por que essa cara de tristeza, meu caro discípulo?”
“Meu irmão…”
“Alaran? O que houve com ele? Vejo que ele não voltou com vocês.”
“Ele ficou para enfrentar Aviran.”
“E você teme por ele, correto?”
“Sim, mestre.”
“Ghan, ele ficou para enfrentar Aviran para que eu pudesse fugir.”
“Sim, Samara. Mas nós já sabíamos o que iria acontecer. Alaran é um Seyan. Ele sabe disso desde muito cedo e desenvolveu suas habilidades. Não se abatam por ele. Não será nesta luta que ele irá perecer.”
“Como pode ter certeza, mestre?”
“Certeza eu não tenho. Mas tenho fé e acredito no potencial dele. Venham, vocês precisam se recuperar, se não fisicamente, mentalmente sim.”
“Ghan, tome. O anel ainda não pode ser meu por direito.”
“Sim, ainda não. Mas o dia para que possa tomá-lo em definitivo está cada vez mais próximo.”
“Espero que sim.”

Caminhando em direção à casa de Ghan, Jayn olha para o céu na direção da entrada de Kálera. Raios e trovões se formam em nuvens pesadas acima do local. Um desses raios desce vertiginosamente ao chão e uma explosão ocorre. Uma nuvem prateada se ergue na mesma direção e forma uma imagem.

“Alaran. Você sobreviveu.”

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