Lobisomens.

Um lobisomem naturalmente é um predador muito perigoso. O que dizer então de uma matilha? Como predadores naturais dos vampiros e sabendo que um grupo caçaria melhor que um sozinho, Nöel D’Brier vem, ao longo do tempo, tentando formar a matilha perfeita na caça de seu maior inimigo: Antoine Charrier.

Durante toda sua vida, seus encontros foram sangrentos, mas nunca fatais, o que sempre impediu que ambos construíssem um exército. Além disso, um predador comum também contribuiu não só para impedir tal objetivo como também os fez fugir para a América, mais precisamente o Brasil.

“Nöel, Nöel, uma tragédia aconteceu.”
“Calma, Alícia, calma. Nada de drama. O que houve?”
“Um grupo de vampiros matou o Leonardo na Abolição.”
“Como? Ele estava sozinho?”
“Bem…”
“O que você está me escondendo, Alícia? Eu dei ordem para ninguém sair atrás dos vampiros sozinho.”
“Ele não quis saber. Ele disse que iria encontrar Antoine e matá-lo.”
“Garoto louco. Eu que vivo nesta terra desde muito antes do nascimento de vocês ainda não consegui esta façanha. Por que ele achou que conseguiria?”
“Não sei, Nöel. O que faremos?”
“Vocês não vão fazer nada. Eu vou.”
“Mas…”
“Alícia, o nosso inimigo não é bobo. Ele tem quase a minha idade, se não tiver mais. Tudo que ele faz é bem planejado, por isso eu lhes ordenei para não ir atrás deles.”
“E o que você fará agora?”
“Vou até uma conhecida em comum.”


A casa não é muito grande, mas também não é ruim. Uma acomodação agradável para alguém que se acostumou a uma vida nômade por conta de sua natureza. O lobisomem francês, Nöel, bate à porta. Uma jovem de pouco mais de quinze anos abre.

“Pois não?”
“Marie Delacour está?”
“Marie? Aqui não mora nenhuma…”
“Joana, deixe-o entrar.”
“Sim, senhora.”

Nöel entra na casa e, sem cerimônias, se acomoda numa poltrona. Uma mulher entra na sala. Branca, cabelos negros compridos até a cintura, olhos verdes cor de jade, lábios finos porém apetitosos e chamativos pintados num vermelho vivo, sem se tornar vulgar.

“Pode deixar, Joana. Eu atendo o senhor. Vá para seu quarto.”
“Sim, senhora.”

A jovem sai da sala e os dois se olham por algum tempo em silêncio.

“Não pensei que voltaria a me procurar.”
“Nem eu. Joana?”
“Minha filha.”
“Com o demônio?”
“Não sou adoradora de demônios. Nem todas somos. Nossa arte é sempre relacionada ao mal. Uma pena.”
“Você não respondeu.”
“Joana é minha filha, sim. Concebida num acaso da obra de Deus. Ela não sabe o que eu fui.”
“Foi? Não é mais?”
“Não mais, Nöel. Eu cansei deste fardo, desta vida, de tudo. Eu era caçada e não quero mais isto.”
“Eu nunca fui caçado, não é? Só você foi.”
“O que quer de mim? Veio relembrar o passado?”
“Antoine.”
“Antoine? – ela estremece. O que tem ele?”
“Sabia que ele está no Brasil?”
“Não, não sabia.”
“Está. E eu preciso de sua ajuda.”
“Eu não posso. Não contra ele.”
“Sua magia ainda funciona em mim?”
“Sempre funcionará. O que você quer? Se ele descobrir sobre mim, você sabe que ele me matará.”
“Não matará. Você sempre foi bastante poderosa para ele. E, pelo que sei, vocês ficam mais poderosas com o tempo, assim como nós. Eu vou atrás dele e preciso de sua ajuda. Preciso de duas coisas. Da sua magia em mim para enfrentar o bando dele.”
“Sozinho?”
“Sim, sozinho, como eu já fiz no passado.”
“Mas, no passado, você não o matou.”
“É por isso que preciso do segundo favor.”
“Qual?”
“Preciso que você localize um velho conhecido e diga-lhe para terminar o que eu vou começar.”
“Richter?”
“Sim. Eu não vejo saída a não ser contar com o velho caçador Andreas Richter.”


“Que bebida é esta, Nöel?”
“Algo que irá nos ajudar a destruir o máximo possível de vampiros.”
“Tem certeza?”
“Eu ainda estava na França quando tomei esta poção pela primeira, única e última vez. Éramos em doze lobisomens, menos do que somos agora. A horda vampírica tinha aproximadamente cento e vinte vampiros.”
“Dez para um.”
“Sim. Ao final da batalha, sobramos apenas Antoine e eu. O líder de minha matilha pereceu sob sua fúria, enquanto o ancião deles, o criador de Antoine e dos demais, fugiu.”
“Covarde.”
“Sim, mas eu o encontrei vinte anos depois, antes de vir para o Brasil. Ele era poderoso, mas eu consegui acabar com ele. Prestem atenção no que vou dizer: se acontecer novamente o mesmo desfecho, o lobo que ficar vivo deve envidar esforços para impedir os vampiros até o fim de sua existência. Este legado maldito que nos acompanha tem que ser usado para algo bom.”
“O que quer dizer, Nöel?”
“Lobisomens e vampiros são iguais. São assassinos. Inimigos com um ponto comum: os humanos fazem parte de sua cadeia alimentar.”
“Mas nós não.”
“Já se perguntaram por que não se lembram do que acontece em toda primeira noite de lua cheia? Pois é. É a única noite em que vocês não possuem controle sobre suas ações e vocês só não se entregam à fúria devastadora porque eu os prendo aqui. Senão, muita coisa seria diferente. Lembrem-se disso. Agora vamos. Não temos mais tempo a perder.”

Tomando a forma de lobisomens, os quinze componentes da matilha iniciam uma corrida em direção ao covil dos vampiros. O grupo não leva muito tempo até a fábrica abandonada. O comitê de recepção, formado por dez vampiros, é facilmente subjugado, ou, em outras palavras, morto.

Entrar num covil de vampiros é uma ação temerária, mas Nöel D’Brier já fez isto no passado e sabe exatamente como tudo irá se desenrolar lá dentro.

“Ora, ora, se não é o meu velho amigo, Nöel.”
“Antoine.”
“Pela segunda vez você entra em meu covil. Acha que desta vez o destino será idêntico?”
“Não sei, Antoine, mas eu acho que o final não será o mesmo.”
“É, não será mesmo. Desta vez você vai morrer.”
“Está certo disso?”
“Que tal duzentos e vinte e dois vampiros?”
“Uma média de quatorze para um? Um pouco maior que da última vez, mas ainda assim não é tanto para nós.”
“Conseguiu ajuda da bruxa de novo?”
“Pague para ver.”

A um sinal de Nöel, a matilha se lança ao ataque. Como no passado, a batalha se desenrola mais uma vez sangrenta. Antoine se mantém à distância do embate, como fizera seu mestre no passado. Ele se lembra bem de como a matilha do jovem Nöel rechaçou seus irmãos. Ele sabe do poder e força que Nöel já possuía naquela época e imagina o quanto ele é grande agora.

Se arriscar nunca fez parte de sua conduta. Não depois de ter sobrevivido numa batalha em que sua sina seria diferente, não fosse a bruxa Marie Delacour ter lhe dado também uma poção que o ajudasse.

Antoine sobreviveu graças à habilidade de Marie. A jovem bruxa Marie, sabendo que se François, o líder da matilha de Nöel, descobrisse o que ela fez a mataria, resolveu fugir da França. Fato que a trouxe finalmente ao Brasil.

Seguindo pistas e mais pistas, Antoine também chegou ao Brasil atrás da bruxa. Ele descobriu que, após ela lhe dar uma poção, ela fez o mesmo pelos lobisomens, o que acabou causando o extermínio de seus irmãos.

Nöel, perseguindo Antoine, acabou encontrando Marie primeiro que o vampiro. E, para azar tanto do lobo quanto do vampiro, um amigo da jovem bruxa que devia tê-la queimado em Marselha, não fosse pela paixão arrebatadora, também a procurou todos estes anos. E achou.

Devido à poção, os lobisomens levam extrema vantagem sobre os vampiros. Vendo que sua prole está sendo dizimada, Antoine resolve entrar na batalha, fazendo com que a coisa engrosse pro lado dos lupinos.

Em poucos minutos, a matilha já está reduzida a três: Alícia, Hugo e Nöel. Do lado dos vampiros, apenas dois se mantêm de pé ainda: a jovem Rosana, que Antoine fez de esposa, dando-lhe de beber de seu próprio sangue, fortalecendo-a de maneira a quase igualar sua habilidade, e o próprio Antoine.

“Parece que a história se repete, Nöel.”
“Você acha, Antoine?”
“Ora, dois vampiros e três lobisomens. Digamos que, em mais algumas rodadas, só os mais fortes permanecerão vivos. A diferença é que desta vez há sangue ancião em mais de um vampiro.”
“Há uma coisa que você não está levando em conta, até por não saber, Antoine.”
“É? E do que você estaria falando?”
“De mim, mon ami.”
“Richter?” – reconhece, sobressaltado, o vampiro francês.
“Oui, le temps de mourir, des monstres!!!”

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