A patinação é um esporte de uma beleza ímpar. Com saltos e currupios, ou spins, seus praticantes se tornam famosos pela bela postura que adquirem. A beleza plástica apresentada por rapazes, moças e duplas inevitavelmente consegue, naturalmente, chamar a atenção de quem assiste. O esporte traz à vida das pessoas diversos benefícios e um deles, talvez o mais importante na vida do ser humano, é a conquista de novas e sólidas amizades.
É graças à patinação artística que as vidas de cinco meninas se misturam e tomam rumos que nenhuma delas jamais pensou que pudesse seguir. Rafaela, Yasmim, Bruna, Amanda e Sophia. As belas patinadoras do Instituto Santa Clara, no Barra da Tijuca.
18h30min, início do treino da escolinha de patinação com a professora Tati. Como de costume, a professora observa qual aluno da escolinha poderá se tornar atleta da equipe do Instituto e mudar seu horário de treino para as 19h30min. Algumas meninas demonstram que têm vontade de integrar a equipe, mas pouco talento. Outras demonstram talento, mas nenhuma vontade. Poucas não demonstram talento nem vontade, estão ali apenas para aprender a andar e se divertir durante as aulas. Duas demonstram muito talento e muita vontade. A peneira assim se torna fácil.
Amanda e Yasmim são as duas meninas possuidoras de talento e com uma grande vontade de participar de competições pela escola. Tati as observa com carinho e cuidado. A cada salto, a cada currupio, sua certeza quanto às duas aumenta. Tati interrompe o treino das duas e as chama.
“Meninas, meninas, vocês estão indo muito bem. Uma grande evolução.”
“Obrigada, professora.” — responde Yasmim, a mais meiga das duas.
“Sim, obrigada.”
“Ao final da aula vocês farão um teste. Passando pelas etapas, poderão começar a treinar com a equipe hoje mesmo, se quiserem.”
“Que ótimo, eu quero sim, professora.”
“Eu também.”
No momento em que encerra a conversa com as duas jovens, uma moreninha chamada Bruna passa executando uma sequência de saltos, cinco para ser mais exato, o que chama a atenção imediata da professora. Ela espera a jovem terminar os saltos para chamá-la.
“Maravilhoso, Bruna. Excelente sequência.”
“Obrigada, professora.”
“Está a fim de vir para a equipe? Quer fazer o teste?”
“Acho que não, professora. Eu gosto de patinar, mas só por diversão.”
“Tudo bem. Mas eu acho que você se tornaria uma excelente patinadora.”
“Obrigada.”
Após agradecer, Bruna volta a rodar na quadra e Tati permanece observando e orientando as meninas durante a aula.
Por volta das 19h15min, Lucca, um dos filhos gêmeos da professora Tati, chega à aula. Mais uma vez atrasado, principalmente depois que seu pai o suspendeu da equipe, mandando-o treinar com o pessoal da escolinha para que aprendesse um pouco de humildade. Fato que naturalmente tira a mãe do sério, pois o rapaz leva muito jeito para o esporte, mas não se preocupa em cumprir os horários.
“Chegou cedo para amanhã, Lucca.”
“Também te amo, mãe. Eu cheguei pra aula da equipe.”
“Quem disse que você faz parte da equipe?”
“Ora, mãe, você e meu pai sabem muito bem que eu sou um dos melhores da equipe.”
“É, mas você foi suspenso, lembra? Abriu uma vaga na equipe titular e eu não irei contra o seu pai. Aliás, está vendo aquele garoto ali?” — Tati aponta para um rapaz, meio duro, mas cravando as voltas de saltos.
“Ele é bom, meio duro, mas crava as voltas.”
“Pois é, vou fazer um teste com ele. Se ele passar, a tua vaga na equipe passa pra ele.”
“Que isso? Está falando sério?”
“Estou sim. Quer voltar pra equipe? Se dedica, principalmente, a cumprir horário. Desde que foi suspenso você não chega um dia na hora certa. Dá pra fazer isso pela sua mãe?”
“Mãe, eu tenho talento. Se eu não puder ser da equipe, também não quero ser da escolinha.”
“Você que sabe.”
Enquanto Tati e Lucca travam esta pequena discussão, Bruna se aproxima das outras duas meninas chamadas para fazer o teste.
“Amanda, quem é aquele garoto que está falando com a professora?”
“Você não sabe?”
“Não.”
“Aquele é o Lucca, o filho da professora Tati. Ele e a irmã gêmea são da equipe. Você nunca o viu por aqui?”
“Não. Eu sempre vou embora quando acaba a escolinha.”
“Amanda, eu acho que a Bruna gostou do Lucca.”
“Não é nada disso. Eu apenas estou curiosa, pois nunca o vi por aqui.”
“É bom que seja só curiosidade mesmo.”
“Por quê, Amanda?”
“Porque ele é um rapaz meio sem noção. Não quer saber de nada. Ele é meio malandrão.”
“Mas é bonito.”
“Você gostou dele, Bruna? Vem cá.”
Yasmim puxa Bruna pelo braço e a leva até Sophia, a irmã de Lucca, que acaba de chegar à quadra. Aproveitando o fato de ser da sala de Sophia, Yasmim explica a situação para ela. A gêmea, apesar da negativa de Bruna, a leva até onde seu irmão e sua mãe ainda discutem.
“Oi, mãe. Lu, a Bruna tá precisando de uma ajuda com um Salchow que não está saindo legal. Dá para dar uma força?”
Tati, ao ouvir tal afirmativa, não entende nada, pois Bruna acabara de passar fazendo uma sequência perfeita e um dos saltos era justamente o Salchow. Sophia pisca para a mãe e olha para o irmão.
“Mas, Phi…”
“Ah, maninho, dá uma ajuda para minha amiga, por mim, vai?”
“Tá bom. O que é que eu não faço por ti.”
“Valeu. Bruna, este é o Lucca. Lucca, esta é a Bruna.”
“Olá. Olha, vai rodando enquanto eu calço meus patins.”
“Tá bom.”
Enquanto Lucca vai calçar os patins, Sophia puxa Bruna e sussurra em seu ouvido.
“Ele está sem namorada, aproveita.”
“Mas, mas…”
Sophia empurra Bruna para a quadra e, pouco mais de dez minutos após, Lucca está rodando ao lado dela, “ajudando-a” a executar um Salchow perfeito. Para Amanda, tal situação não agrada, pois um de seus objetivos com a chegada à equipe era justamente se aproximar de Lucca. Esconder a irritação por ver Bruna tão próxima dele é quase impossível.
O papo entre Lucca e Bruna segue animado até que sua mãe dá por encerrado o treino da escolinha, liberando os alunos e reunindo aqueles que irão fazer o pequeno teste, simbólico, mas importante dentro de sua didática para o ingresso na equipe da escola. Amanda, Yasmim e Christiano são chamados. Bruna, que já dissera à professora que não queria fazer parte da equipe, ao dirigir-se para fora da quadra é interrompida por Lucca.
“Aonde vai, Bruna? Não vai fazer o tal teste da minha mãe? Ela não te chamou mesmo vendo que você tem talento?”
“Chamou sim, Lucca, mas eu não aceitei.”
“Não? Por quê?”
“Porque eu gosto de patinar para me divertir. Nunca pensei em competir.”
Lucca se entristece, pois o pouco tempo em que conversou com a morena fez com que ele a quisesse patinando por mais tempo junto dele.
“Ah não. Eu te ajudo com os saltos pra você me dizer agora que não vai pra equipe? Negativo, deixa de ser medrosa. Se o problema foi a nega que você deu à minha mãe, eu converso com ela. Vai lá, vai fazer o teste.”
“Pra quê, Lucca? Eu não quero competir.”
Sentindo que não vai conseguir convencer a jovem, Lucca faz sinal para que sua irmã se aproxime.
“Sophia, tua amiga amarelou. Não quer ir pra equipe. A mãe chamou e ela não aceitou.”
Percebendo o objetivo do irmão nas entrelinhas, Sophia entra de sola.
“Olha só, Bruna, meu irmão te ajudou porque eu pedi. Então você me deve uma.”
“Mas…”
“Então, pelo menos por mim, que sou sua amiga, vai lá e faz o teste. Eu falo com a mãe.”
“Mas, Sophia, e se eu não passar?”
Sophia se aproxima do ouvido de Bruna e sussurra:
“Passa no teste que você vai ter mais tempo para patinar com ele.”
Só de pensar que vai poder passar mais tempo ao lado de Lucca, Bruna deixa cair a convicção e aceita fazer o teste. Sophia corre até a mãe e pede que ela dê uma chance a Bruna. Percebendo o que está acontecendo, Tati questiona Sophia.
“Sophia, o teu irmão não quer responsabilidade. Se eu deixar a menina ir pra equipe só pra ficar perto do teu irmão, eu vou estar ajudando a iludi-la. Eu não gosto disso.”
“Mãe, deixa que do meu irmão eu cuido. Faz o teste que eu falo com ele.”
“Tá bom.”
Enquanto Tati aplica os testes nos alunos, Kadu, o pai dos gêmeos e treinador da equipe do colégio, chega à quadra com três de seus nove atletas, que estavam na musculação. Ele observa atentamente sua esposa no passo a passo. Todos os saltos e currupios cobrados, livres e em sequência. Para sua grata surpresa, os quatro alunos são aprovados.
Antes que o treino da equipe comece, Sophia conversa com o pai sobre dar mais uma chance a Lucca. O pai até quer se manter duro, mas a filha sabe amolecer seu coração e consegue uma segunda chance para o rapaz, garantindo que ela se responsabiliza por ele. Imediatamente, ela vai lhe dar a notícia.
“Lu, o pai deixou você voltar para a equipe.”
“Sério?”
“Sério, mas tem uma condição.”
“Tinha que ter.”
“Você vai ter que se dedicar a tudo. Ao treino e ao horário, principalmente.”
“Vai ser difícil.”
“Olha só, a Bruna tá na equipe agora. Você não vai querer passar mais tempo com ela? Basta vir treinar no horário.”
“Você é danada, hein? A guria não precisava da minha ajuda coisa nenhuma.”
“Você percebeu?”
“Sim.”
“E por que, mesmo assim, continuou rodando na quadra com ela?”
Lucca olha para a irmã, meio encabulado.
“Eu gostei dela.”
“Que bonitinho, Lu. Vai desencalhar.”
“Para de graça. A guria é novinha, Phi. Só tem quatorze anos.”
“E você tem dezesseis. Grande diferença. Para de história e vai treinar. Aproveita, maninho. Aproveita a chance de voltar para a equipe e de pelo menos conhecer uma garota que pode ser muito legal para você.”
“Tá bom. Vamos treinar.”
“Vamos.”
“Só uma coisa. Eu te amo, tá Phi? Obrigado.”
“Depois eu cobro meus honorários.” — ela sorri. “Também te amo.”
Lucca e Sophia partem para a quadra para treinarem, agora sob o olhar crítico e um tanto quanto severo de seu pai.
Como dito, o esporte cria laços de amizade entre as pessoas e, às vezes, até algo mais. As vidas começam a se unir. Yasmim, Amanda e Bruna, treinando na equipe da escola, tendem a estreitar seus laços de amizade, mesmo com Amanda não gostando da proximidade entre Lucca e Bruna. Sophia, por sua vez, também começa a se aproximar das meninas, trazendo consigo Rafaela, sua amiga, confidente e, claro, excelente patinadora — rivais na quadra, mas grandes amigas fora dela.
Os rumos podem ainda não ter sido mudados, mas o destino já começa a se moldar.