Ao longo de uma vida muitas pessoas se relacionam de alguma forma. Tanto rapazes quanto moças têm uma extrema capacidade em conquistar a amizade do próximo. É fácil demais para as meninas adolescentes conquistarem e solidificarem uma relação de amizade. Principalmente quando se tem algo em comum como estudar na mesma escola e, mais ainda, quando praticam o mesmo esporte.
Com a convivência diária na escola e à noite na equipe de patinação artística, Sophia, Yasmim, Bruna, Amanda e Rafaela, salvo a pouca diferença de idade entre elas, vão se aproximando mais a cada dia. Na mesma balada, outros tipos de relação vão se formando de forma periférica.
Em mais uma noite de treino a descontração por conta da maior proximidade traz uma ajuda mútua nas atividades. Mesmo o treinador tendo deixado as meninas a par de suas categorias de disputa. Por idade, Amanda e Bruna serão adversárias, assim como Sophia, Yasmim e Rafaela também serão entre si.
Bruna e Yasmim conversam durante seu alongamento observando Lucca, Sophia e Rafaela rodarem na quadra.
“Eles são muito bons, não é, Bruna?”
“Sim, muito. Será que a gente chega neste nível?”
“Segundo a Sophia basta treinar com a mesma vontade que patinávamos na escolinha que chegaremos lá.”
Lucca crava um Axel, um salto em que o patinador vem de costas faz a entrada de frente com a perna esquerda, se for destro, e se lança no ar com a direita girando em uma volta e meia.
“Que lindo!”
“O salto ou o Lucca, Bruna?”
“Os dois.”
Lucca configura a saída de seu salto e já voltando a rodar lança um olhar significativo para Bruna, que fica vermelha.
“Bruna, você ficou igual a um tomate.”
“Fiquei?” — pergunta a jovem corada de vergonha.
“Você está gostando dele, não é?”
“Tá gostando de quem, Bruna?” — pergunta Amanda cuja presença não foi percebida pelas duas amigas.
“Dos patins novos que ela ganhou do pai, Amanda. Olha como são bonitos.”
“Sei. Pelo tom das duas, vocês pareciam estar falando do Lucca.”
“E se fosse, Amanda? Você iria ficar com ciúme? Você disse que ele era um malandrão.”
“Bom, é que…”
“É que você tem uma quedinha por ele também, não é, amiga? Vai virar triângulo amoroso.”
“Eu vou treinar, sabe. Você está muito engraçadinha, Yasmim.”
“É, eu também vou.” — diz Bruna ainda extremamente corada.
“Bom, então vamos, não é. A brincadeira não caiu legal. Desculpa.”
As três amigas começam a rodar na quadra a fim de se aquecerem. A piadinha de Yasmim foi um pouco além da brincadeira para Bruna e Amanda. Para Bruna por conta de sua timidez e para Amanda, por esta querer esconder que realmente tem uma queda por Lucca. Como para as meninas a amizade está acima de qualquer brincadeira, mesmo que não tenha muita graça, a piadinha é rapidamente esquecida e não precisa mais que cinco minutos de treino para que elas já estejam saltando, se ajudando e principalmente brincando.
Já com a equipe toda na quadra, o treinador faz uma rápida reunião explicando os fundamentos do treino de hoje. Como seu objetivo é fazer com que todos alcancem o mesmo nível técnico, os primeiros trinta minutos serão de exercícios de entrada e saída de salto simples com uma pequena dose de força a mais para que os saltos comecem a passar de uma volta, caindo no mínimo em uma volta e meia. Lucca, Sophia, Rafaela, Rogério e Matheus por serem os mais experientes terão que dar uma ajuda aos mais novos.
“Matheus acompanha o Pablo e o Juan, Rafa fica com Amanda e Yasmim, Rogério com Lorena e Bruna, Sophia com a Moniquinha e a Lili e Lucca fica com o Christiano. Vamos lá, crianças, vamos treinar.”
Lucca demonstra nitidamente em seu semblante que não gostou nem um pouco da divisão feita por seu pai. Christiano começa o exercício e o gêmeo não lhe dá a atenção ordenada pelo pai, ficando de olho nos movimentos de Bruna. Não precisa mais que cinco minutos para que o jovem patinador venha reclamar.
“Qual é, Lucca, você não vai me ajudar não? Só porque seu pai disse que disputaremos na mesma categoria? Se o problema for este me avisa que eu me viro sozinho.”
“Como é que é?” — a pergunta pega Lucca de surpresa.
“Se não pode me ajudar porque seremos adversários avisa que eu dou meu jeito.”
“Deixa disso, Christiano. Desculpa. O problema não é esse não. Eu te ajudo na boa.”
“Qual o problema então? Eu estou fazendo o exercício e você fica olhando pro outro lado. Não quer ver o que eu faço?”
Sophia, sempre ela, que já percebera o problema, se aproxima dos dois a fim de tirar o irmão do pequeno embaraço e não deixar que um clima ruim e tenso se forme em volta dos dois rapazes.
“Posso saber o que está havendo?”
“O teu irmão não quer me ajudar.”
“Eu já disse que não é isso.”
“O que é então?”
“Calma, Chris. Eu sei o que é. Não é nada com você. Lu, papai não colocou você com o Christiano à toa, pois você tem potencial técnico e sabe disso. E ele precisa de alguém crítico como você para melhorar seu desempenho. Deixa a Bruna treinando com o Rogério e se concentra nele.”
“Poxa, Phi, eu queria trabalhar na melhora dela.”
“Sei, você quer é se aproximar mais dela. Christiano, o Lucca não ficou chateado em treinar você não. Ele queria estar perto da Bruna, não tem nada a ver com você.”
“É, Christiano, foi mal. Eu queria estar com a Bruna, não tem nada a ver com treinar um adversário não. Até porque eu prefiro ser vencido por um amigo a alguém de algum clube que eu nem conheça. Desculpa o mau jeito, vamos treinar?”
“Vamos. Bom, dá pra me desculpar também? Eu tirei conclusões precipitadas.”
“Sem problemas, vamos lá. Eu vou fazer o movimento e você tenta me copiar o máximo que der. Depois você faz sozinho com minhas correções e numa terceira tentativa faz sozinho para eu ver onde você está errando e aí consertamos, ok?”
“Ok, vamos lá.”
“Dinada, viu, Lu?”
“Ô, Phi, brigadão de novo, maninha.”
Lucca dá um beijo rápido na irmã e volta ao treino com Christiano, prestando atenção somente no rapaz. O que, sem que ele perceba, deixa Bruna um pouco triste por não receber sequer um olhar do jovem gêmeo.
O treino se desenrola de forma bastante tranquila, com algumas quedas é claro. Afinal de contas não existe treino de patinação artística sem que ocorram quedas e mais quedas. Aliás, Lucca puxou ao pai, pois as suas chegam a ser cinematográficas. Quedas à parte, o resultado do treino se mostra excelente e atinge muito além da expectativa inicial de Léo. Os últimos trinta minutos são para um treino livre para os mais experientes da equipe e um treino mais voltado a currupios para os outros. A única exceção se faz justamente entre Lucca e Christiano que, a pedido do primeiro, continuam no treinamento de saltos. Como dissera Sophia, Lucca tem uma visão técnica muito boa e, percebendo que o jovem Christiano pode cravar um Axel — aquele salto de uma volta e meia — ainda nesta noite, resolve continuar com o rapaz.
Aquela capacidade de rapazes e moças em conquistar amizade é realmente algo fantástico e se faz presente também na relação de Lucca e Chris. Os rapazes, adversários como algumas das meninas, parecem deixar tal questão de lado e vão, nas conversas, indo além das técnicas de patinação.
“Você está a fim da Bruna, Lucca?”
“Acho que sim, Christiano. Não tenho muita certeza ainda.”
“Como assim não tem certeza?”
“Bom, eu não parei ainda para conversar um pouco mais com ela para saber se combinamos.”
“Ah tá, entendi. Hum, deixa eu te fazer uma pergunta?”
“Corrige a postura.”
“Hã?”
“Anda tranquilo do meu lado, mas corrige a postura. Fica mais ereto. Vai, pergunta.”
“Tá, vou acertar. Na tua sala tem uma ruiva…”
“Laura.”
“É, ela mesma. Ela tem namorado?”
“Ela namorava um cara do colégio militar. Eu lembro que ele veio aqui vê-la um dia. Um tremendo otário. Acho que ela terminou, ela não fala mais dele. Por quê? Tá a fim dela?”
“Estou.”
“Vai lá e fala com ela.”
“Ah, qual é, Lucca. Falar é fácil.”
“Você é tímido?”
“Não, mas não quero tomar um fora.”
“Quer que eu fale com ela?”
“Dá para dar esta força?”
“Dá, claro. Amanhã eu falo, beleza? Agora chega de descanso e vamos ao que interessa.”
“Vamos.”
Enquanto Christiano retoma o treinamento, Bruna continua absorta e procurando por um olhar de Lucca que, infelizmente para a tímida morena, nem se volta para ela.
Graças ao empenho de Lucca e ao mérito do esforço de Christiano ele crava um Axel perfeito no finalzinho do treino. O rapaz termina o movimento e cumprimenta Lucca num sincero aperto de mão. Para Lucca fica também a satisfação de, mesmo sendo Chris um adversário em potencial num futuro, saber que ajudou alguém que parece estar se tornando um grande amigo seu. Realmente a adolescência é a fase em que se formam as amizades, mesmo com pequenas disputas em alguns momentos, mas que nada interferem naquelas que se tornam ou podem vir a se tornar sólidas relações afetivas.
Numa relação sincera de amizade todos acabam ganhando. Neste caso em especial, Chris obteve um amigo capaz de intermediar sua aproximação à ruiva Laura de modo a não ficar numa situação chata caso tenha uma negativa da menina. A própria Laura, nova personagem nesta nossa história, por poder conhecer um bom rapaz e deixar para trás a tristeza que o ex namorado lhe trouxe. E Lucca e Bruna. Mas por que os dois se até agora o que aconteceu foi Lucca ter deixado de lhe dar a mesma atenção do treino passado? Bem, Chris é da sala de Bruna e para felicidade da jovem, ele lhe diz que Lucca vai esperá-la no final da aula do dia seguinte para fazer-lhe companhia até sua casa.
É como eu disse, amigos são pessoas mais que importantes na vida de todos nós. E começam assim, primeiro ajudando no esporte, depois na paquera e no futuro quem sabe em que mais um amigo pode se fazer presente na vida de nossos adolescentes?